Ilegitimidade passiva
DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO ELEITORAL E RECURSO ADESIVO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DE TERCEIRO NÃO CANDIDATO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE) POR CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. IMPROCEDÊNCIA. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. RECURSO PRINCIPAL DESPROVIDO. RECURSO ADESIVO NÃO CONHECIDO.
I. CASO EM EXAME
1.1. Recurso eleitoral interposto contra sentença que julgou improcedente a ação de investigação judicial eleitoral (AIJE) por captação ilícita de sufrágio ajuizada contra candidatos eleitos a prefeito e vice-prefeito, e de candidata a vereadora, bem como extinguiu o feito por ilegitimidade passiva quanto ao coordenador de campanha.
1.2. Alegação inicial de que o então candidato a vice-prefeito teria ajustado a compra de 7 votos com um eleitor, orientando-o a “tratar” com o coordenador de campanha, que, mais tarde, teria realizado dois pagamentos via Pix. O recurso sustenta haver provas robustas: prints de conversas por WhatsApp, comprovantes Pix e laudo de extração de dados telefônicos da Polícia Federal.
1.3. Interposição de recurso adesivo pelos demandados, arguindo preliminar de inépcia da inicial.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
2.1. Há três questões em discussão: (i) verificar a legitimidade passiva de terceiro não candidato em ação por captação ilícita de sufrágio; (ii) examinar se a prova produzida é suficiente para comprovar a prática do ilícito; (iii) definir a admissibilidade do recurso adesivo.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3.1. Matéria preliminar.
3.1.1. Ilegitimidade passiva ad causam (art. 485, inc. VI, do CPC). Coordenador de campanha. A jurisprudência consolidada do TSE estabelece que somente candidatos podem figurar no polo passivo da ação fundada no art. 41-A da Lei n. 9.504/97, motivo pelo qual é correta a extinção do feito quanto a terceiro não candidato.
3.1.2. Rejeitada arguição de inépcia da inicial. Proposta AIJE com requerimentos expressos de condenação dos demandados por prática de abuso de poder e captação ilícita de sufrágio. O procedimento observou o rito do art. 22 da LC n. 64/90, conforme determina o art. 44 da Resolução TSE n. 23.608/19, inexistindo qualquer prejuízo (art. 219, CE). Observância da Súmula n. 62 do TSE.
3.2. Mérito.
3.2.1. A captação ilícita de sufrágio exige prova robusta e incontestável da participação ou anuência dos candidatos beneficiários. No caso, não há nos autos conjunto probatório firme e coerente capaz de demonstrar a ciência ou a anuência dos candidatos em relação à conduta de terceiro (coordenador). A anuência por interposta pessoa, no caso em tela, é concluída por presunção.
3.2.2. O laudo policial não confirmatório, a evidente quebra da cadeia de custódia, as contradições internas no depoimento de eleitor e ausência de corroboração por outros meios de prova convergem para a insuficiência do liame subjetivo necessário entre o ato do terceiro e a anuência ou conhecimento dos candidatos.
3.2.3. A mera relação de subordinação entre candidatos e coordenador de campanha não autoriza, por si, a imputação por captação ilícita de sufrágio. A relação de trabalho com coordenador não equivale à coautoria, tampouco supre a necessidade de demonstração de anuência, ou de que o resultado dependia da vontade dos candidatos.
3.2.4. A tese de que o simples encaminhamento do eleitor ao coordenador configuraria "anuência" por domínio do fato contraria a dogmática do 41-A: exige-se prova segura de participação, ordem ou, ao menos, anuência consciente do candidato, não presumível de hierarquia de campanha. A jurisprudência repele imputação automática por atos de terceiros sem elo subjetivo demonstrado.
3.2.5. O abuso de poder econômico, por sua vez, pressupõe utilização desproporcional de recursos, em grau suficiente a comprometer a normalidade e a legitimidade do pleito, o que não se configurou no caso concreto.
3.2.6. O recurso adesivo não comporta conhecimento, bem como prejudicadas as respectivas contrarrazões, por ausência de interesse superveniente, uma vez que o recurso principal é desprovido.
IV. DISPOSITIVO E TESE
4.1. Rejeitada a matéria preliminar. Recurso eleitoral desprovido. Recurso adesivo não conhecido.
Teses de julgamento: "1. Somente candidatos podem responder por captação ilícita de sufrágio, não havendo legitimidade passiva de terceiros não candidatos; 2. A configuração da captação ilícita de sufrágio depende de prova robusta e inconteste da participação ou anuência dos candidatos beneficiários, o que não se verifica quando a prova é contraditória, frágil ou carece de confiabilidade. 3. O recurso adesivo não deve ser conhecido quando o recurso principal é desprovido."
Dispositivos relevantes citados: Lei n. 9.504/97, art. 41-A; LC n. 64/90, art. 22, inc. XVI; Código de Processo Civil, art. 485, inc. VI; Resolução TSE n. 23.608/19, art. 44.
Jurisprudência relevante citada: TSE, AgR-REspEl n. 0000551-36.2016.6.08.0018, Rel. Min. Edson Fachin, j. 24.9.2020; TSE, AgR-Respe n. 27.238, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 01.3.2018; TSE, RO-El n. 0601661-45.2018.6.03.0000, Rel. Min. Raul Araújo Filho, j. 09.02.2023; TSE, RO-El n. 0602284-17.2018.6.10.0000, Rel. Min. Carlos Horbach, j. 16.12.2021.
RECURSO ELEITORAL nº060035205, Acórdão, Relator(a) Des. Caroline Agostini Veiga, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 24/10/2025.
DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2024. RECURSO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). ABUSO DE PODER POLÍTICO. USO INDEVIDO DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. PRELIMINAR DE OFÍCIO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA COLIGAÇÃO. PRODUÇÃO DE CONTEÚDO MANIPULADO POR MEIO DE INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL. AUSÊNCIA DE UTILIZAÇÃO OU DIVULGAÇÃO DO MATERIAL. INEXISTÊNCIA DE GRAVIDADE E REPERCUSSÃO. RECURSO DESPROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1.1. Recurso eleitoral interposto por candidato eleito ao cargo de prefeito nas eleições de 2024 contra sentença que julgou improcedente Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) ajuizada contra candidatos adversários e coligação, por suposto abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação social.
1.2. Acusação de que os investigados teriam planejado e iniciado a produção de vídeos por meio de inteligência artificial, manipulando imagem e voz do candidato recorrente, com o propósito de induzir o eleitor a erro e assim desequilibrar a disputa eleitoral.
1.3. A sentença entendeu que não restou configurado o ilícito eleitoral, por ausência de provas de que o conteúdo tenha sido efetivamente produzido, divulgado ou utilizado como propaganda eleitoral, classificando os atos como meramente preparatórios e inofensivos ao processo eleitoral.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
2.1. Há três questões em discussão: (i) saber se a coligação pode figurar no polo passivo de AIJE; (ii) saber se as gravações clandestinas apresentadas como prova são lícitas; (iii) saber se restou configurado abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação social.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3.1. Preliminar. Reconhecida de ofício a ilegitimidade passiva da coligação, pois as sanções cabíveis na AIJE aplicam-se exclusivamente a pessoas físicas, conforme orientação pacífica do Tribunal Superior Eleitoral.
3.2. Mérito. Na hipótese, as gravações ambientais clandestinas são lícitas, pois realizadas em locais públicos, sem controle de acesso. Eventual violação à intimidade ou quebra de expectativa de privacidade não foi sequer suscitada pelos investigados.
3.3. Ilícito não configurado. Embora os diálogos revelem tratativas para confecção de vídeos manipulados por meio de inteligência artificial generativa (deepfakes), com finalidade eleitoral, não há prova de sua produção, difusão ou utilização, bem como retribuição ou promessa de retribuição, de qualquer espécie, pela tarefa, que não foi sequer iniciada pelo suposto contratado.
3.4. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral afirma que a caracterização do abuso de poder exige “que a gravidade dos fatos seja comprovada de forma robusta e segura a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta (aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo)”, o que não ocorreu no caso dos autos.
3.5. Afastada a litigância de má-fé. Ausentes elementos que demonstrem alteração dolosa da verdade, uso abusivo do processo ou intuito de causar dano à parte adversa, considerando tratar-se de matéria inovadora, em razão das tecnologias emergentes, que ainda desafia a tutela eleitoral.
IV. DISPOSITIVO E TESE
4.1. Recurso desprovido. Extinção, de ofício, do processo em relação à coligação demandada, por ilegitimidade passiva. Indeferimento do pedido de condenação do recorrente por litigância de má-fé.
Teses de julgamento: "1. Em AIJE, a coligação não possui legitimidade passiva, pois as sanções de cassação e inelegibilidade incidem apenas sobre pessoas físicas; 2. As gravações ambientais clandestinas realizadas em locais públicos, sem controle de acesso, constituem prova lícita; 3. A caracterização do abuso de poder político e do uso indevido dos meios de comunicação social exige a comprovação de atos concretos com gravidade e repercussão, não se configurando pela mera preparação ou cogitação de produção de conteúdos ilícitos, como vídeos manipulados por inteligência artificial (deepfake)."
Dispositivos relevantes citados: Código de Processo Civil, art. 485, inc. VI; Lei Complementar n. 64/90, art. 22, caput e inc. XIV; Resolução TSE n. 23.610/19, art. 9º-C.
Jurisprudência relevante citada: TSE, Agravo em Recurso Especial Eleitoral n. 060017063, Rel. Min. Floriano de Azevedo Marques, DJe 25.9.2023; TSE, Agravo em Recurso Especial Eleitoral n. 060098479, Rel. Min. Floriano de Azevedo Marques, DJe 31.5.2024; TRE/RS, Recurso Eleitoral n. 060061785, Rel. Des. Amadeo Henrique Ramella Buttelli.
RECURSO ELEITORAL nº060031791, Acórdão, Relator(a) Des. Maria De Lourdes Galvao Braccini De Gonzalez, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 01/10/2025.
DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO. MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA. MÉRITO. CONDUTA VEDADA. CONTRATAÇÃO E NOMEAÇÃO DE SERVIDORES EM PERÍODO VEDADO. REDUÇÃO DA MULTA AO MÍNIMO LEGAL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1.1. Recurso eleitoral interposto por candidatos não eleitos aos cargos de prefeito e vice-prefeita contra sentença que julgou parcialmente procedente representação por conduta vedada (art. 73, inc. V, da Lei n. 9.504/97), condenando-os ao pagamento de multa individual em razão da nomeação de servidor e contratação temporária de empregados públicos no período vedado.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2.1. Definir se a candidata a vice-prefeita possui legitimidade passiva para figurar no polo da representação.
2.2. Estabelecer se as contratações e nomeações enquadram-se nas exceções previstas no art. 73, inc. V, als. “c” e “d”, da Lei n. 9.504/97.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3.1. Preliminar de ilegitimidade passiva afastada. A recorrente, na condição de candidata ao cargo de vice-prefeita, invariavelmente angariaria benefício direto com as condutas narradas na inicial, ainda que praticadas exclusivamente pelo seu companheiro de chapa, que concorreu ao cargo de prefeito. Legitimada para responder à ação e ter garantido o seu direito de defesa e exercício do contraditório.
3.2. Mérito. O art. 73, inc. V, da Lei das Eleições veda, nos três meses que antecedem o pleito e até a posse dos eleitos, a nomeação e contratação de servidor público, ressalvadas a nomeação de aprovados em concurso público homologado até o início daquele prazo e a nomeação ou contratação necessária ao funcionamento de serviços públicos essenciais.
3.3. A contratação do servidor para exercer o trabalho de operador de máquinas ocorreu durante o período vedado, incluindo a publicação do edital inicial do processo seletivo, a homologação da classificação e a assinatura do termo do contrato administrativo de trabalho, sem demonstração de que a contratação ocorreu para serviço público essencial.
3.4. O entendimento dos Tribunais Eleitorais é no sentido de que a contratação temporária de servidores, sem a homologação prévia do processo seletivo, durante o período vedado pela Lei das Eleições, não se enquadra nas exceções previstas no art. 73, inc. V, al. "d", da Lei n. 9.504/97, que só se aplica quando for demonstrada a imprescindibilidade do serviço para a sobrevivência, saúde ou segurança da população.
3.5. É regular a contratação temporária da servidora aprovada em processo seletivo homologado em 2023, em momento anterior ao início da vedação legal, pois o fato está abrangido pela exceção prevista no art. 73, inc. V, al. “c”, da Lei n. 9.504/97, merecendo reforma a decisão recorrida.
3.6. Em relação à nomeação do empregado público, não é possível a aplicação da exceção prevista no art. 73, inc. V, al. “c” da Lei n. 9.504/97, uma vez que a homologação de seu nome no rol dos aprovados ocorreu durante o período vedado.
3.7. Ausência de comprovação da extrema urgência na contratação do servidor para laborar como motorista. Não suprida a exigência legal de prévia e expressa autorização do chefe do Poder Executivo informando que a nomeação ocorreu para o funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais. O fato de se encontrar lotado na Secretaria Municipal de Saúde, por si só, não indica a essencialidade da atividade a ser desenvolvida pelo servidor.
3.8. Efeitos da homologação da desistência da nomeação e da posterior revogação do ato de nomeação. O desfazimento do ato de nomeação do servidor não afasta a infração eleitoral, pois, na análise de fatos que caracterizam conduta vedada, são irrelevantes as alegações de erro, ausência de má-fé ou de dolo, e de inexistência de prova de prejuízo ao erário ou de desequilíbrio do pleito. A revogação da portaria de nomeação não afasta o cometimento da conduta vedada.
3.9. Redução da multa. Ausência de elemento que justifique a fixação da pena de multa além do mínimo legal, uma vez que não foi apurada gravidade capaz de afetar a legitimidade e a normalidade das eleições. Mantida a condenação individual.
3.10. Afastada, de ofício, a declaração de nulidade dos atos administrativos, por incompetência da Justiça Eleitoral quanto à matéria.
IV. DISPOSITIVO E TESE
4.1. Rejeitada a matéria preliminar.
4.2. Recurso parcialmente provido. Redução da multa. Afastada a irregularidade quanto à contratação da servidora, bem como a declaração de nulidade dos atos de nomeação contida na sentença.
Teses de julgamento: “1. A candidata a vice-prefeita possui legitimidade passiva em ações por conduta vedada, em razão da indivisibilidade da chapa majoritária. 2. A contratação de aprovados em concurso ou processo seletivo homologado antes do período vedado é admitida pela exceção prevista no art. 73, inc. V, al. “c”, da Lei n. 9.504/97. Apenas serviços emergenciais de saúde, segurança e sobrevivência configuram “serviços públicos essenciais” para fins da ressalva do art. 73, inc. V, al. “d”, da Lei n. 9.504/97.
Dispositivos relevantes citados: CF/88, art. 5º, inc. LV; CE, art. 91; Lei n. 9.504/97, art. 73, inc. V, als. “c” e “d”, §§ 4º, 5º e 8º; Resolução TSE n. 23.735/24, art. 20, § 1º.
Jurisprudência relevante citada: TSE, RO n. 0603037-55/DF, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, publ. 23.3.2022; TSE, AI n. 58788/SC, Rel. Min. Rosa Weber, j. 07.12.2017, DJe 09.02.2018; TSE, AREspE n. 00005019420166150024, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 30.6.2022; TSE, AREspEl n. 060051543/CE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 07.04.2022, publ. 20.4.2022; TRE-RS, RepEsp n. 0603729-25.2022, Rel. Des. Luis Alberto Dazevedo Aurvalle, j. 25.4.2023, DJe 27.4.2023.
RECURSO ELEITORAL nº060049470, Acórdão, Relator(a) Des. Caroline Agostini Veiga, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 04/09/2025.
DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL (AIJE). ILEGITIMIDADE PASSIVA DO PARTIDO. FRAUDE À COTA DE GÊNERO. CANDIDATURAS FICTÍCIAS. CASSAÇÃO DO DEMONSTRATIVO DE REGULARIDADE DE ATOS PARTIDÁRIOS (DRAP). INELEGIBILIDADE. RECONTAGEM DOS QUOCIENTES ELEITORAL E PARTIDÁRIO. RECURSO PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1.1 Recurso interposto contra sentença que julgou improcedente Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) por suposta fraude à cota de gênero, nas Eleições de 2024, rejeitando tese de candidaturas fictícias e mantendo o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) da agremiação.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2.1. Verificar a ilegitimidade do diretório municipal para figurar no polo passivo da AIJE.
2.2. Verificar se houve fraude à cota de gênero.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3.1. Matéria preliminar.
3.1.1. Reconhecida, de ofício, a ilegitimidade do órgão partidário para figurar no polo passivo de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE), pois as consequências jurídicas dessa espécie de ação são restritas à cassação do registro ou diploma e à sanção de inelegibilidade de pessoas físicas, não podendo o partido político sofrer qualquer das consequências próprias desse meio processual.
3.1.2. A preliminar de revelia em razão da não apresentação da contestação tempestivamente está prejudicada, ante o reconhecimento da ilegitimidade passiva da agremiação partidária. Ademais, a existência da pluralidade de investigados, com a apresentação tempestiva da defesa por um dos réus, bastaria para afastar os efeitos da revelia, nos termos do art. 345, inc. I, do CPC. Preliminar rejeitada.
3.1.3. Em relação à irregularidade na abertura de prazo suplementar para indicação de provas, após o oferecimento da contestação, verifica-se que tal providência visou garantir o contraditório e a ampla defesa, não havendo vedação legal à prática de atos instrutórios complementares no rito do art. 22 da LC n. 64/90, quando considerados pelo magistrado como essenciais ao deslinde do caso. Ausência de prejuízo ao recorrente. Preliminar rejeitada.
3.2. Mérito.
3.2.1. A legislação eleitoral brasileira, em seu art. 10, § 3º, da Lei n. 9.504/97, estabelece de forma clara e imperativa que cada partido ou coligação preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo.
3.2.2. A teor do art. 8º, § 2º, da Resolução TSE n. 23.735/24, a obtenção de votação zerada ou irrisória de candidatas, a prestação de contas com idêntica movimentação financeira e a ausência de atos efetivos de campanha em benefício próprio são suficientes para evidenciar o propósito de burlar o cumprimento da norma que estabelece a cota de gênero, conclusão não afastada pela afirmação não comprovada de desistência tácita da competição.
3.2.3. Votação zerada ou inexpressiva.
3.2.3.1. O conjunto probatório indica que as candidatas não realizaram atos efetivos de campanha e que não houve a apresentação de motivação de qualquer ordem para o esvaziamento de suas próprias candidaturas.
3.2.4. Ausência de atos efetivos de campanha.
3.2.4.1. Inexistência de prova convincente de que as candidatas tenham realizado atos mínimos de campanha eleitoral em prol de suas próprias candidaturas.
3.2.4.2. Os registros da mobilização não comprovam a atividade de campanha própria em favor das candidatas recorridas, sequer que tenha havido alguma interação com eleitores ou distribuição de santinhos em favor de suas candidaturas no pleito proporcional.
3.2.4.3. As declarações apresentadas pela defesa constituem-se de documentos unilaterais, destituídos de qualquer mecanismo de autenticação quanto ao seu autor e não judicializado quanto à expressão de seu conteúdo, de modo que não se mostram idôneas como prova de efetiva atividade de campanha.
3.2.4.4. Nenhuma das três candidatas utilizou-se da internet para a sua campanha eleitoral, nenhum endereço eletrônico foi informado em seus registros de candidatura e nenhuma espécie de postagem de cunho eleitoral foi apontada nos autos. Não é crível que as concorrentes à disputa eleitoral tenham abdicado, apesar de terem acesso, do uso de comunicação eleitoral por mídias digitais, sobretudo considerando a difusão de redes sociais em uma ampla gama de estratos sociais.
3.2.5. Prestações de contas padronizadas e sem movimentação financeira relevante.
3.2.5.1. A padronização das contas eleitorais associada à ausência de atos efetivos de campanha reforça a tese de candidaturas fictícias. As operações foram realizadas apenas para a construção de uma contabilidade mínima e comum a todos os concorrentes.
3.2.5.2. A padronização também é constatada nos requerimentos de registro de candidaturas apresentados, pois todos consignam um único e idêntico endereço para notificações e para sede de comitê, bem como um mesmo endereço de e-mail e um mesmo contato telefônico.
3.2.5.3. A padronização contábil, nesse cenário, não configura apenas isonomia operacional das contas, mas sim elemento sintomático do cumprimento meramente formal da cota de gênero.
3.3. Conclusão.
3.3.1. Candidaturas fictícias. Demonstrado que as candidatas não realizaram atos mínimos de campanha, não divulgaram material eleitoral em redes sociais, apresentaram prestação de contas padronizadas, receberam votação ínfima ou nula e não comprovaram desistência lícita ou causas impeditivas.
3.3.2. As candidatas não declararam quaisquer espécies de óbices ou transtornos que as tivessem prejudicado ou desestimulado à disputa, ou conduzido à decisão pela desistência, ainda que de forma tácita. Apenas uma das candidatas apresenta explicações, por provas incongruentes e com agudos indícios de manipulação, a partir da intervenção partidária.
3.3.3. Afastada a incidência da sanção de inelegibilidade ao recorrido, pois não está demonstrada, nesta ação, sua participação direta no lançamento de candidaturas fictícias ou sua anuência com tal prática.
IV. DISPOSITIVO E TESE
4.1. Extinguir, de ofício, o processo, sem resolução de mérito, em relação ao órgão municipal do partido. Rejeitar as demais preliminares.
4.2. Recurso provido. Reconhecida a fraude à cota de gênero.
4.3. Cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP) do pleito proporcional e os registros e diplomas dos candidatos a ele vinculados, inclusive suplentes e eleitos.
4.4. Condenar as candidatas à sanção de inelegibilidade pelo período de 8 (oito) anos subsequentes à Eleição de 2024.
4.5. Decretar a nulidade dos votos obtidos pelo partido no pleito proporcional, com a recontagem dos quocientes eleitoral e partidário.
Teses de julgamento: “1. Diretório municipal de partido político é parte ilegítima para figurar no polo passivo da Ação de Investigação Judicial Eleitoral. 2. A fraude à cota de gênero configura-se com a presença de um ou alguns elementos, quando os fatos e as circunstâncias do caso concreto assim permitirem concluir, como votação zerada ou ínfima, ausência de atos efetivos de campanha, contas padronizadas e falta de justificativa idônea para o abandono tácito da candidatura”.
Dispositivos relevantes citados: CF/88, art. 14, § 9º; Lei n. 9.504/97, art. 10, § 3º; LC n. 64/90, art. 22, inc. XIV e parágrafo único; CPC, arts. 345, inc. I, e 485, inc. VI; Código Eleitoral, art. 222; Resolução TSE n. 23.735/24, arts. 8º, §§ 2º e 4º.
Jurisprudência relevante citada: TSE, Súmula n. 73; TSE, AgR-REspEl n. 0600170-63/RS, Rel. Min. Floriano de Azevedo Marques, DJe 25.9.2023; TSE, REspEl n. 0600311-66/MA, Rel. Min. Raul Araújo Filho, DJe 08.5.2023; TRE-RS, RE n. 0600584-12/RS, Rel. Des. Vanderlei Tremeia Kubiak, DJe 07.7.2022; TRE-RS, RE n. 0600586-79/RS, Rel. Des. Voltaire de Lima Moraes, DJE 09.10.2023.
RECURSO ELEITORAL nº060050704, Acórdão, Relator(a) Des. Maria De Lourdes Galvao Braccini De Gonzalez, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 01/09/2025.
DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2024. RECURSO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DE PRÉ-CANDIDATO ACOLHIDA. AUSÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. SÚMULA 38 DO TSE. PROCESSO EXTINTO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.
I. CASO EM EXAME
1.1. Recurso interposto contra sentença que indeferiu inicial de ação de investigação judicial eleitoral (AIJE) proposta em face de vereador e pré-candidato a prefeito, apontando abuso de poder político e uso indevido de meios de comunicação.
1.2. O indeferimento da inicial tem fundamento na ausência de elementos mínimos de caracterização do abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação.
II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO
2.1. Verificar a legitimidade passiva de pré-candidato para figurar como parte investigada na AIJE.
2.2. Analisar a ausência de litisconsórcio passivo necessário entre os integrantes da chapa majoritária.
2.3. Avaliar a legitimidade do partido político isolado para propor a ação após a formação de coligação.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3.1. Preliminar de ilegitimidade passiva acolhida. Ausência de interesse na propositura da demanda.
3.1.1. A jurisprudência do TSE admite na AIJE o exame de fatos ocorridos antes do registro de candidatura. Todavia, no caso, sequer havia a escolha do candidato em convenção partidária quando do ajuizamento da ação.
3.1.2. O termo inicial para ajuizamento da AIJE, segundo o TSE, é o registro de candidatura, não sendo cabível a sua propositura se não estiver em jogo a análise de eventual benefício contra quem já possui a condição de candidato.
3.1.3. O fato de o recorrido exercer o mandato eletivo de vereador em nada modifica a ausência de legitimidade passiva, que, na ação de investigação judicial eleitoral, se dá pelo cargo pleiteado no pedido de registro de candidatura.
3.2. Ausência de formação de litisconsórcio passivo necessário.
3.2.1. Irregularidade cuja consequência é o ajuizamento prematuro da ação, que foi proposta somente contra o candidato a prefeito, não sendo dirigida ao candidato a vice-prefeito, o qual não integra a lide e não foi citado nos autos.
3.2.2. Matéria consolidada no enunciado da Súmula n. 38 do TSE: “Nas ações que visem à cassação de registro, diploma ou mandato, há litisconsórcio passivo necessário entre o titular e o respectivo vice da chapa majoritária”.
3.3. Diante da formação de coligação após o ajuizamento da ação, o partido não possui mais legitimidade para atuar isoladamente em juízo. O art. 6º, § 1º, da Lei n. 9.504/97 estabelece que a coligação deve funcionar como um só partido no relacionamento com a Justiça Eleitoral e no trato dos interesses interpartidários.
IV. DISPOSITIVO E TESE
4.1. Extinção do feito sem resolução de mérito, com fundamento no art. 485, inc. VI, do CPC.
Teses de julgamento: “1. O pré-candidato não possui legitimidade passiva para figurar como investigado em AIJE ajuizada antes do registro de candidatura. 2. Nas ações eleitorais que visem à cassação de registro, diploma ou mandato, a formação de litisconsórcio passivo necessário entre os integrantes da chapa majoritária é obrigatória. 3. A formação de coligação retira a legitimidade do partido político isolado para ajuizar ou prosseguir com a ação referente ao processo eleitoral”.
Dispositivos relevantes citados: LC n. 64/90, art. 22, inc. XIV; CPC, art. 485, inc. VI; Lei n. 9.504/97, art. 6º, § 1º.
Jurisprudência relevante citada: TSE, RO n. 0000107-87.2014.6.13.0000, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 17.9.2015; TSE, AgR-REspe n. 955944296/CE, Rel. Min. Arnaldo Versiani, j. 16.8.2011; TRE-RS, RE n. 44449/RS, Rel. Des. Silvio Ronaldo Santos de Moraes, j. 19.12.2016.
RECURSO ELEITORAL nº060002033, Acórdão, Relator(a) Des. Patricia Da Silveira Oliveira, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 22/01/2025.
AGRAVO INTERNO. AÇÃO DE PERDA DE CARGO ELETIVO. ELEIÇÕES 2020. INDEFERIMENTO DE PETIÇÃO INICIAL. ILEGITIMIDADE PASSIVA. POSSE OCORRIDA DE MANEIRA PRECÁRIA NA CONDIÇÃO DE SUPLENTE. NECESSIDADE DE A SUBSTITUIÇÃO SER SUPERIOR AO PRAZO DE 120 (CENTO E VINTE) DIAS PARA A INCIDÊNCIA DA REGRA DE INFIDELIDADE PARTIDÁRIA. NEGADO PROVIMENTO.
1. Agravo interno interposto contra decisão monocrática que julgou extinta ação de perda de cargo eletivo, sem resolução de mérito, em razão da ilegitimidade passiva.
2. Os motivos para a extinção do feito sem resolução de mérito ocorreram mediante o apontamento de condição objetiva, criada pela jurisprudência exatamente para retirar a precariedade da situação daqueles suplentes que tenham se evadido de agremiação partidária e eventualmente venham a ocupar, em regime de substituição, cargo de mandato eletivo. Assim, o prazo decadencial de 30 (trinta) dias se inicia após a posse definitiva do suplente na cadeira do titular, sendo necessário que a substituição seja superior ao prazo de 120 (cento e vinte) para a incidência da regra da infidelidade partidária. Nesse sentido, o exercício do mandato de vereador em substituição ao titular por período de um a dois dias não é apto a inaugurar a contagem do prazo decadencial de propositura da ação de perda de mandato eletivo, uma vez que, sem a assunção definitiva do cargo, inexiste interesse jurídico da agremiação em requerêlo judicialmente (AI Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 0600106-55.2019.6.21.0000 PORTO ALEGRE RS, Acórdão de 06/05/2021, Relator Min. Luís Roberto Barroso, Publicação: DJE Diário da justiça eletrônico, Tomo 105, Data 10/06/2021).
3. Provimento negado.
(Petição nº 060025631, Acórdão, Relator(a) Des. JOSÉ VINICIUS ANDRADE JAPPUR, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 26/10/2022)
RECURSOS. ELEIÇÕES 2020. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL - AIJE. REPRESENTAÇÃO POR CAPTAÇÃO E GASTOS ILÍCITOS DE RECURSOS. REPRESENTAÇÃO POR CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E ABUSO DE PODER ECONÔMICO. EXPEDIENTE DE PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS. REUNIÃO DOS FEITOS. JULGAMENTO CONJUNTO. CANDIDATOS ELEITOS AO PLEITO MAJORITÁRIO. PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE PASSIVA E DECADÊNCIA. AFASTADAS. MÉRITO. INFRAÇÃO AOS ARTS. 30-A E 41-A DA LEI N. 9.504/97. FORNECIMENTO DE COMBUSTÍVEIS EM TROCA DE VOTOS. SIMULAÇÃO DE DOAÇÕES PARA O PAGAMENTO DE DESPESAS COM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. OMISSÃO DE RECURSOS E DESPESAS NA PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATURA. CASSAÇÃO DOS DIPLOMAS. APLICAÇÃO DE MULTA. REALIZAÇÃO DE NOVAS ELEIÇÕES. ART. 224 DO CÓDIGO ELEITORAL. NEGADO PROVIMENTO AOS RECURSOS.
1. Insurgência contra sentenças exaradas em Ação de Investigação Judicial Eleitoral - AIJE, em representação por captação e gastos ilícitos de recursos e em representação por captação ilícita de sufrágio, processos aos quais se encontra ainda associado expediente de Produção Antecipada de Provas, todos referentes a candidatos eleitos ao pleito majoritário nas eleições de 2020. Julgamento conjunto.
2. Recurso Eleitoral do Ministério Público Eleitoral na Representação n. 0600524-21.2021.6.21.0044, julgada improcedente por insuficiência de provas. Irresignação ao argumento de haver elementos probatórios demonstrando o fornecimento, pelo prefeito reeleito e pelo vice, de cargo público para eleitora em troca de seu voto e de seus familiares. A captação ilícita de sufrágio somente se aperfeiçoa quando alguma das ações típicas elencadas no art. 41-A da Lei n. 9.504/97 (doar, oferecer, prometer ou entregar bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza a eleitor ou, ainda, praticar violência ou grave ameaça ao eleitor), cometidas durante o período eleitoral, estiver, intrinsecamente, associada ao objetivo específico de agir do agente, consubstanciado na obtenção do voto do eleitor. A ausência de qualquer um desses vetores integrativos conduz, inevitavelmente, ao juízo de improcedência da demanda. No caso dos autos, diante da ausência de influência na vontade livre do eleitor e na inexistência de outras provas que comprovem o objetivo de captar o voto ilicitamente, impõe-se a manutenção de improcedência da ação. Ademais, a contratação de cargos em comissão é exceção à conduta vedada prevista no art. 73, inc. V, da Lei das Eleições, o que reforça a ausência de proibição da contratação. Desprovimento.
3. Recurso Eleitoral de agremiação e candidatos não eleitos ao pleito majoritário na AIJE n. 0600501-75.2020.6.21.0044. Distribuição de combustível a eleitores em troca do voto. Parcial procedência da representação para cassar os diplomas do prefeito e vice do município, com fulcro no art. 41-A, caput e § 1º, da Lei das Eleições. Imposição de multa. 3.1. A jurisprudência do TSE é pacífica no sentido de reconhecer apenas a legitimidade de candidato para responder à ação que envolva o ilícito do art. 41-A da Lei n. 9.504/97. Do mesmo modo, coligação não detém legitimidade para figurar no polo passivo de AIJE por abuso de poder econômico ou político, pois as consequências jurídicas dessa espécie de ação (cassação do registro/diploma e inelegibilidade) são incompatíveis com a sua natureza jurídica. Manutenção da sentença no ponto em que extinguiu o processo, sem julgamento do mérito, em relação a presidente partidário e coligação. 3.2. Mérito. Postulada a necessidade de convocação de novas eleições também para o pleito proporcional e a majoração da multa pela captação ilícita de sufrágio. As consequências jurídicas da sentença somente podem ser aplicadas a quem foi parte no processo e os candidatos a vereador não integraram o polo passivo da demanda, inviabilizando qualquer sancionamento. Inexistência de qualquer razão para elevar a multa do patamar mínimo, devendo ser mantido o quantum estabelecido na sentença. Desprovimento.
4. Recursos eleitorais dos candidatos eleitos ao pleito majoritário. 4.1. AIJE n. 0600501-75.2020.6.21.0044. Irresignação contra sentença que reconheceu a prática do ilícito previsto no art. 41-A da Lei das Eleições, em relação à oferta de combustível em troca de votos de eleitores. Inviável a tese defensiva de que nos autos não há a identificação de nenhum eleitor que teria recebido combustível em troca de seu voto. No curto período de sete dias foram entregues, mediante vales (de 10 a 20 litros), previamente comprados pelos responsáveis pela campanha, 945 litros de gasolina, afastando o argumento de terem sido usados por cabos eleitorais, cujo rol de trabalhadores nunca foi apresentado para corroborar a tese. Ademais, toda a estratégia de campanha foi feita clandestinamente, à margem do controle eleitoral, tendo em vista que não constou na prestação de contas dos recorrentes absolutamente nenhum litro de combustível. 4.2. Representação n. 0600036-32.2021.6.21.0044. 4.2.1. Preliminar de decadência rejeitada. Representação ajuizada pelo MPE dentro do prazo previsto pela EC n. 107/20, pois imputado fato que se amolda ao disposto no art. 30-A da Lei n. 9.504/97. 4.2.2. Mérito. Irresignação contra sentença que julgou procedente o pedido para cassar os diplomas eleitorais dos candidatos eleitos aos cargos de prefeito e vice, com fulcro no art. 30-A, § 2º, da Lei n. 9.504/97, determinando a realização de nova eleição para os cargos majoritários no município. A jurisprudência do TSE firmou-se no sentido de que, para incidência das consequências jurídicas dispostas no art. 30-A da Lei das Eleições, a gravidade do evento deve estar associada à relevância jurídica da captação ou gasto ilícito, suficiente a comprometer a moralidade, transparência e higidez das regras eleitorais pertinentes à matéria. Na hipótese, o valor omitido com despesas de combustível representa 26,10% do total gasto na campanha, ou seja, mais de ¼ de todos os recursos financeiros teoricamente utilizados pelos candidatos em sua jornada eleitoral. Além disso, identificada doação em dinheiro para pagamento de honorários advocatícios de forma simulada, captada por meio de pessoa interposta, ou seja, doador originário não declarado na prestação de contas. Irregularidades que, somadas, equivalem a quase 50% do total de despesas declaradas na prestação de contas. Tais condutas (omissão de declaração e simulação de doações) enquadram-se nos termos do art. 30-A da Lei n. 9.504/97, segundo o qual a sonegação das despesas implica a cassação dos mandatos: comprovados captação ou gastos ilícitos de recursos, para fins eleitorais, será negado diploma ao candidato, ou cassado, se já houver sido outorgado (Art. 30-A, § 2º, da Lei das Eleições). Inegável a relevância jurídica da sonegação de gastos, pois empregados de forma simulada e utilizados para compra de votos.
5. Comprovadas tanto a distribuição de combustível a eleitores em troca de votos em benefício da candidatura majoritária quanto a omissão dos respectivos recursos e despesas na prestação de contas de candidatura, assim como a simulação de doações para o pagamento de despesas com honorários advocatícios, deve ser mantido o enquadramento dos fatos na moldura dos arts. 30-A e 41-A da Lei n. 9.504/97. Cassação dos diplomas. Multa. Realização de novas eleições majoritárias no município.
6. Provimento negado aos recursos.
(Recurso Eleitoral nº 060050345, Acórdão, Relator(a) Des. DES. FEDERAL LUÍS ALBERTO D`AZEVEDO AURVALLE, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 14/10/2022)
RECURSOS. AÇÕES DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL - AIJEs. IMPROCEDÊNCIA. FRAUDE NO PREENCHIMENTO DA COTA DE GÊNERO. IDENTIDADE DOS FATOS, PARTES E CAUSAS DE PEDIR. JULGAMENTO CONJUNTO. PRELIMINARES SUPERADAS. SUPLENTES. LITISCONSÓRCIO PASSIVO FACULTATIVO. ILICITUDE DA PROVA. PROCEDIMENTO PREPARATÓRIO ELEITORAL PPE. CARÁTER INQUISITORIAL. PARTIDO POLÍTICO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO PARTIDO REPRESENTADO. EXTINÇÃO DO FEITO. ART. 485, INC. VI, DO CPC. LEGITIMIDADE PASSIVA DO PRESIDENTE DO PARTIDO. MÉRITO. COTA DE GÊNERO. LEI N. 9.504/97. PROMOÇÃO DA PARTICIPAÇÃO FEMININA. SUPOSTAS CANDIDATURAS FICTÍCIAS. CONTEXTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA DEMONSTRAR A OCORRÊNCIA DE FRAUDE NAS CANDIDATURAS. PROVIMENTO NEGADOS AOS RECURSOS.
1. Recursos contra sentença que julgou improcedentes as AIJEs reunidas em conjunto no juízo de origem em razão de pedido comum: reconhecimento da fraude envolvendo candidaturas femininas na nominata para o cargo de vereador do partido
nas eleições de 2020.
2. Matéria preliminar 2.1. Da legitimidade passiva dos candidatos e da decadência. Segundo a jurisprudência atual do Tribunal Superior Eleitoral, nas ações ajuizadas com base na existência de fraude à cota de gênero devem constar, obrigatoriamente, no polo passivo da ação, todos os candidatos eleitos e, portanto, detentores de mandato eletivo passível de cassação em decorrência da procedência da ação, na condição de litisconsortes passivos necessários. Recentemente, a Corte Superior afastou a configuração da decadência por ausência de integração dos candidatos suplentes no polo passivo em AIMEs e AIJEs que têm como objeto suposta fraude à cota de gênero. Eventuais suplentes das vagas parlamentares podem figurar como litisconsortes passivos facultativos e, caso não integrados à demanda oportunamente, não resta inviabilizado o prosseguimento da ação por tal motivo. Dessa forma, o entendimento mencionado afasta a necessidade de integração de todos os candidatos da chapa às lides e justifica a circunstância de não haver coincidência no polo passivo das demandas, ora analisadas conjuntamente, em relação aos candidatos demandados, quais sejam, os candidatos suplentes, considerados litisconsortes facultativos. As ações foram propostas, em face de todos os candidatos eleitos, em 30.11.2020 (AIJE n. 0600584-12) e 09.12.2020 (AIJE n. 0600585-94), portanto antes da cerimônia de diplomação, não havendo como se falar em decadência. 2.2 Da ilicitude da prova. O procedimento preparatório eleitoral instaurado tinha natureza eminentemente administrativa e inquisitorial, cujo intuito era trazer subsídios para formar o próprio convencimento do Parquet sobre os fatos e permitir a obtenção de um substrato mínimo de prova a amparar ações eleitorais viáveis. Ademais, a prova produzida restou submetida à ampla defesa e ao contraditório no curso do processo judicial. 2.3. Da ilegitimidade passiva do partido e de seu presidente. Considerando que o inc. XIV do art. 22 da Lei Complementar n. 64/90 prevê, em caso de procedência da ação, a declaração da inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, é de reconhecer a impossibilidade, no caso concreto, de atribuição de qualquer sanção ao partido político. Ainda que inicialmente aceita a inclusão da agremiação na lide, é de ser reconhecida a sua ilegitimidade para a causa. Extinção dos feitos, sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil, em relação ao partido representado. O mesmo não ocorre em relação ao presidente partidário, em razão da viabilidade, em tese, de que se declare sua inelegibilidade, se confirmada a condição de agente do abuso.
3. Contexto fático. Alegada fraude em duas candidaturas femininas, uma vez que estas não teriam realizado campanha eleitoral em benefício próprio e teriam sido lançadas na disputa à Câmara Municipal de forma fictícia, apenas para viabilizar a obediência ao percentual mínimo de 30% de cada gênero. A cota de gênero, instrumento legal de incentivo à participação feminina na política, posta sob o fomento e a proteção da Justiça Eleitoral, está prevista no art. 10, § 3º, da Lei n. 9.504/97. O preenchimento fraudulento das reservas de gênero frustra o intuito da norma e, ao invés de promover a participação feminina, apenas reforça a exclusão da mulher da política, em prejuízo do pluralismo e da representatividade política, pressupostos para uma democracia plena.
4. Conforme a jurisprudência, os indícios que apontariam uma candidatura falsa seriam o baixo investimento financeiro na campanha, com operações voltadas apenas a demonstrar a regularidade da candidatura; a relação de parentesco com outros candidatos a mesmo cargo, sem nenhuma notícia de eventual animosidade familiar ou política que justificasse a disputa; a ausência de propaganda por parte da candidata e/ou a realização de campanha em benefício de outro candidato; e a contabilização de poucos votos em seu favor. Nesse sentido está o Enunciado n. 60, de caráter doutrinário, aprovado na I Jornada de Direito Eleitoral promovida pela Escola Judiciária Eleitoral do Tribunal Superior Eleitoral, em fevereiro a maio de 2020.
5. Acervo probatório. 5.1. Demonstrada a regularidade de uma das candidaturas, uma vez que, embora tenha obtido a quantidade inexpressiva de seis votos, comprovou interesse em realizar campanha eleitoral, relatando as dificuldades havidas no pleito de 2020 em relação à disputa anterior, em que havia concorrido e angariado um número substancial de votos. Ademais, ainda que modestamente, realizou divulgação da sua candidatura na internet. 5.2. Em relação à segunda candidata, o conjunto probatório não confere a certeza da existência de fraude em relação à candidatura. Os elementos dos autos conduzem à conclusão de que a recorrida desejava ser candidata e realizou atos de campanha no município, vindo a desistir de divulgar seu nome no decorrer do período eleitoral por fatores alheios à sua vontade. Necessidade de se considerar as peculiaridades locais a fim de verificar as alegações das partes. Dessa forma, o exame da realidade das candidaturas no município, que se extrai tanto dos depoimentos quanto da sentença recorrida, permite concluir pela inexistência de fraude ou abuso de poder.
6. Para o julgamento de procedência do pedido, a prova de fraude na cota de gênero deve ser robusta e levar em conta a soma das circunstâncias fáticas do caso a denotar o incontroverso objetivo de burlar o mínimo de isonomia entre homens e mulheres que o legislador pretendeu assegurar no art. 10, § 3º, da Lei 9.504/97, na linha de precedente do Tribunal Superior Eleitoral (Recurso Especial Eleitoral n. 060085995, Relator Min. Benedito Gonçalves, publicado em 25.05.2022), o que não é o caso dos autos. Prestigiada a vontade popular.
7. Extinção de ambos os feitos, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do Código de Processo Civil, em relação ao partido. Rejeitadas as demais preliminares. Provimento negado aos recursos.
(Recurso Eleitoral nº 060058594, Acórdão, Relator(a) Des. DES. VANDERLEI TERESINHA TREMEIA KUBIAK, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 07/07/2022)

