Prescrição
RECURSO CRIMINAL. PRESCRIÇÃO. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. MODALIDADE RETROATIVA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE EM RELAÇÃO A UM DOS RÉUS. ART. 107, INC. IV, DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINAR DE NULIDADE PROCESSUAL. INVERSÃO DA ORDEM DE ALEGAÇÕES FINAIS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. REJEITADA. MÉRITO. ART. 299 DO CÓDIGO ELEITORAL. OFERTA DE VANTAGENS EM TROCA DE VOTOS. PROVAS DOCUMENTAIS E TESTEMUNHAIS INSUFICIENTES A CORROBORAR A CONDENAÇÃO. DOLO ESPECÍFICO NÃO COMPROVADO. PRÁTICA DE PECULATO-DESVIO NÃO DEMONSTRADA. INEXISTÊNCIA DE PROVAS INCONTESTES. IMPOSSIBILIDADE DE SE BASEAR A CONDENAÇÃO EM PRESUNÇÕES. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DO DESVIO DOLOSO DE BENS OU RENDAS PÚBLICAS. ABSOLVIÇÃO. ART. 386, INC. VII, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. PROVIMENTO.
1. Insurgência contra a sentença que, julgando parcialmente procedente a denúncia apresentada pelo Ministério Público Eleitoral, condenou o primeiro réu à pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de reclusão, mais o pagamento de 20 (vinte) dias-multa, no valor unitário de 1/5 (um quinto) do salário mínimo, pela prática dos crimes do art. 299 do Código Eleitoral, por 4 (quatro) vezes, em continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal), e crime do art. 1º, inc. I, do Decreto-Lei n. 201/67, além de aplicar as penas de inabilitação para o exercício de cargo ou função pública, eletiva ou de nomeação, pelo prazo de 5 anos, e de reparação civil do dano causado ao patrimônio público; e condenou o segundo à pena de 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, mais o pagamento de 20 (vinte) dias-multa, no valor unitário de 1/5 (um quinto) do salário mínimo, pela prática dos crimes do art. 299 do Código Eleitoral, por 4 (quatro) vezes, em continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal).
2. Prescrição reconhecida de ofício. Recorrente com 70 (setenta) anos de idade desde a data em que supostamente foram praticados os fatos descritos na exordial. Atração da regra do art. 115 do Código Penal. Condenação de 1 (um) ano e 3 (três) meses de reclusão, pela prática do crime do art. 299 do Código Eleitoral, por quatro vezes, em continuidade delitiva. Nos termos do art. 119 do Código Penal, a prescrição, causa extintiva da punibilidade, incidirá sobre a pena aplicada para cada um dos crimes, isoladamente, devendo ser desconsiderado o aumento de pena em decorrência da continuidade delitiva. Assim, entre a publicação da sentença condenatória, último marco interruptivo da prescrição, e a presente data, decorreu prazo superior a dois anos, não estando presentes outras causas de interrupção ou de suspensão do prazo prescricional. Reconhecida a prescrição da pretensão punitiva na modalidade retroativa (art. 110, § 1º, do Código Penal).
3. Preliminar de nulidade processual em razão da inversão da ordem de apresentação das alegações finais. O Superior Tribunal de Justiça sedimentou o entendimento de que “o reconhecimento de nulidades no curso do processo penal, seja absoluta ou relativa, reclama uma efetiva demonstração do prejuízo à parte, sem a qual prevalecerá o princípio da instrumentalidade das formas positivado pelo art. 563 do CPP (pas de nullité sans grief)” (STJ - AgRg no HC: 710305 PB 2021/0386768-0, Data de Julgamento: 14.06.2022, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 20.06.2022). Na hipótese, os réus nada manifestaram acerca da situação nas alegações finais, deixando de arguir qualquer prejuízo ou vício com a entrega antecipada das alegações, e sequer pugnaram por eventual reabertura de prazo após eventuais memoriais acusatórios. Desse modo, deve ser rejeitada a prefacial, por não ter sido alegado o prejuízo decorrente da inversão da ordem das alegações finais na primeira oportunidade em que constatado pela parte interessada.
4. Mérito. Oferta de vantagens indevidas a eleitores com o intuito de obter votos em favor do candidato ao cargo de prefeito por coligação apoiada pelo recorrente. O art. 299 do Código Eleitoral exige, para sua configuração, a presença de dolo específico do agente (elemento subjetivo especial do injusto), ou seja, que a vontade e consciência de praticar a conduta (dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem) tenha como especial fim de agir a obtenção do voto de eleitor determinado ou sua abstenção às urnas.
5. Afirmado pelo recorrente que os programas habitacionais no município foram realizados desde o início de seu primeiro mandato. Os depoimentos colhidos são coesos e convergentes quanto ao aspecto de que, para fazer jus aos benefícios dos programas de habitação (construção de casa ou recebimento de materiais de construção de melhorias na residência), era necessário o prévio cadastramento dos munícipes junto à Secretaria de Assistência Social, o qual ocorreu antes mesmo do período eleitoral de 2016. Evidenciado que não houve o beneficiamento direcionado de eleitores, uma vez que os materiais de construção foram distribuídos apenas a pessoas carentes que haviam passado por uma prévia triagem, mediante cadastro nos programas habitacionais do município. Ainda, os depoimentos colhidos demonstraram que a empresa inicialmente contratada para a execução dos projetos voltados à construção de moradias populares abandonou as obras durante o ano de 2016, após a interrupção de repasse de verbas pelo Governo Federal, o que impôs ao então gestor público a necessidade de concluir as obras com recursos próprios, sob pena de ver inviabilizado o direito à moradia de pessoas carentes locais.
6. O depoimento da única pessoa a afirmar que teria havido pedido de voto em troca do fornecimento dos materiais de construção ocorreu na fase policial, não tendo sido ouvido na fase judicial, sob o amparo do contraditório e da ampla defesa. Nos termos do art. 155 do Código de Processo Penal, o depoimento prestado na fase policial não pode, isoladamente, conferir suporte para um édito condenatório. A ausência de confirmação do depoimento perante a autoridade judicial, oportunidade em que poderia ser confrontado pela defesa dos recorrentes acerca de suas alegações, fragiliza o depoimento prestado exclusivamente na fase do inquérito policial, notadamente porque não encontra amparo no restante do bojo probatório. Ademais, necessário destacar que a testemunha confirmou ser adversário político dos recorrentes à época dos fatos, razão pela qual suas declarações merecem ser analisadas com as cautelas inerentes à testemunha suspeita.
7. Da análise das provas documentais e testemunhais produzidas nestes autos verifica-se que não restou suficientemente comprovado na conduta dos agentes o dolo específico à prática do crime descrito no art. 299 do Código Eleitoral, consistente na vontade consciente e voluntária em obter o voto ou conseguir a abstenção de eleitores em troca dos materiais de construção fornecidos. Ao contrário, os depoimentos prestados em juízo corroboram as alegações dos recorrentes de que apenas visavam concluir a construção ou as melhorias nas residências de pessoas carentes do município. Assim, por não existir prova suficiente e cabal do dolo específico na conduta do recorrente, imperiosa a reforma da sentença de primeiro grau, para fins de absolvê-lo da acusação de prática dos crimes de corrupção eleitoral (art. 299 do Código Eleitoral), nos termos do art. 386, inc. III, do Código de Processo Penal.
8. Condenação pela prática de “peculato-desvio”, em razão de desvios de recursos pertencentes à Administração Pública Municipal, para, visando ao beneficiamento da candidatura de seu correligionário, adquirir materiais de construção que foram entregues a eleitores em troca do voto (art. 1º, inc. I, do Decreto-Lei n. 201/67). As provas produzidas não demonstram de modo convincente e indubitável que houve desvio de recursos públicos pelos recorrentes, na medida em que a prova oral é sólida quanto à narrativa de que as verbas utilizadas pelo então prefeito à época serviram à conclusão de obras habitacionais no município, destinadas a pessoas carentes, e que haviam sido interrompidas após cessação de repasse de recursos por outros entes federados. Ainda, não restou demonstrado desvio doloso de bens ou rendas públicas por parte do recorrente, visando a proveito próprio ou alheio, havendo elementos que evidenciam que tais recursos foram destinados a projetos habitacionais há muito em execução no município.
9. Extinção da punibilidade de um dos acusados, em razão da prescrição na modalidade retroativa. Provimento ao apelo e absolvição do recorrente remanescente.
RECURSO CRIMINAL ELEITORAL nº000000309, Acórdão, Relator(a) Des. CAETANO CUERVO LO PUMO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 18/12/2023.
RECURSO CRIMINAL. DENÚNCIA. MINISTÉRIO PÚBLICO. PARTICIPAÇÃO EM INSCRIÇÕES FRAUDULENTAS DE ELEITORES. CONTINUIDADE DELITIVA. CONDENAÇÃO. PRELIMINAR. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO EM FACE DA PENA EM CONCRETO. CRIMINOSO MAIOR DE SETENTA ANOS NA DATA DA SENTENÇA. RECONHECIDA. PROSSEGUIMENTO DO PROCESSO COM RELAÇÃO AO RÉU REMANESCENTE. MATÉRIA FÁTICA. AUXÍLIO MATERIAL. DECLARAÇÕES DE RESIDÊNCIA FALSAS. TRANSPORTE. PRISÃO EM FLAGRANTE. CONVERSÃO. HABEAS CORPUS. LIBERDADE PROVISÓRIA. ALEGADA INOBSERVÂNCIA DO ART. 155 DO CPP. EXISTÊNCIA DE PROVAS IRREPETÍVEIS. PROVA EXTRAJUDICIAL CONFIRMADA POR PROVA COLETADA NA FASE JUDICIAL. INEXISTÊNCIA DE NULIDADE. DOSIMETRIA. NÃO CARACTERIZADO O CRIME DO ART. 289 DO CÓDIGO ELEITORAL EM RELAÇÃO A UM DOS ELEITORES. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. PARCIAL PROVIMENTO.
1. Insurgência contra sentença condenatória pela prática de crimes de participação em inscrições fraudulentas de eleitores (CE, art. 289, c/c CP, art. 29), em continuidade delitiva (CP, art. 71), relativamente a fatos ocorridos em maio de 2012. Oferecimento de denúncia pelo Ministério Público Eleitoral.
2. Preliminar. Prescrição da pretensão punitiva do Estado em face da pena em concreto. Uma vez proferida sentença condenatória, com trânsito em julgado para o Ministério Público, calcula-se a prescrição pela pena em concreto na sentença (CP, art. 110, § 1º) para cada delito individualmente, desprezando-se o acréscimo decorrente da continuidade delitiva. Assim, o marco inicial é a data do recebimento da denúncia, e o primeiro termo interruptivo, a data da prolação da sentença condenatória, consoante o art. 112, inc. I, do CP. 2.1. Reconhecida a ocorrência de prescrição em relação a um dos réus, condenado a dois anos e um mês de reclusão, cujo prazo prescricional é de oito anos (CP, art. 109, inc. IV), reduzido pela metade por contar o apenado com mais de setenta anos (CP, art. 115). Uma vez que entre a data do recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença condenatória transcorreram seis anos, nove meses e sete dias (contados na forma do art. 10 do CP), a declaração de prescrição é medida que se impõe. Não realizada análise de mérito. 2.2. Não reconhecida a prescrição em relação ao outro réu, uma vez que foi condenado a dois anos e seis meses de reclusão, que se sujeita a um prazo prescricional de oito anos (CP, art. 109, inc. IV). Entre a data do recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença condenatória, e entre a última e a presente data, transcorreram menos de oito anos.
3. Matéria fática. Auxílio material, por meio de declarações de residência, com conteúdo falso, e de transporte para que pessoas se inscrevessem fraudulentamente eleitores no município. Ocorrência de prisão em flagrante, convertida em preventiva, e posterior ordem de habeas corpus concedida por este Tribunal.
4. Alegação de que a condenação teria sido subsidiada, exclusivamente, em prova extrajudicial, contrariando o disposto no art. 155 do CPP. Esse artigo consagra o princípio do livre convencimento na valoração das provas, no qual se expressa a liberdade do juiz atrelada à análise das provas produzidas em contraditório judicial, sendo-lhe vedado julgar com base exclusiva nos elementos produzidos no inquérito. Entretanto, este mesmo dispositivo legal abarca três exceções: as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. No caso dos autos, destaca-se a existência de provas irrepetíveis colhidas na investigação policial e depoimentos juramentados de três agentes policiais federais, colhidos em juízo, confirmando os depoimentos obtidos em fase inquisitorial. Em respeito ao princípio constitucional do contraditório, a prova extrajudicial pode ser utilmente oposta ao acusado, na medida em que possui amparo suficiente na prova coletada durante a instrução.
5. Prova documental entabulada em fase extrajudicial, confirmada por meio da prova oral colhida em sede judicial. Requerimentos de alistamento eleitoral, comprovantes de endereço em nome de terceiro e respectivas declarações de residência referentes aos endereços declarados nos RAEs. Embora acostados aos autos na fase extrajudicial, foram objeto de contraditório na fase de instrução, nada sendo oposto quanto ao teor ou veracidade, restando com idênticos valores probantes, independente da fase em que apresentados.
6. Inexistência de óbice à condenação baseada apenas em prova testemunhal, desde que não haja dúvida quanto à parcialidade das testemunhas. No ponto, não consta nos autos eventual nulidade diante da parcialidade das testemunhas. Os testemunhos e depoimentos judiciais das autoridades policiais não são depoimentos indiretos de pessoas que não assistiram aos fatos, haja vista que a prisão foi em flagrante delito. As testemunhas relataram os fatos em juízo diretamente, ou seja, a partir do que efetivamente perceberam acontecer, momento em que as partes e o juiz têm a oportunidade, garantida no art. 212 do CPP, de inquirir a testemunha e buscar expor eventuais inconsistências no relato.
7. Condenação fundamentada não apenas nas provas produzidas na fase inquisitorial, mas, sobretudo, nas provas orais colhidas em juízo, por meio de testemunhos e interrogatórios judiciais, os quais confirmaram a prova documental e os depoimentos extrajudiciais.
8. Dosimetria. Não caracterizado o crime do art. 289 do Código Eleitoral em relação a um dos eleitores. Redimensionamento da pena.
9. Parcial provimento.
RECURSO CRIMINAL ELEITORAL nº000001462, Acórdão, Relator(a) Des. Luis Alberto Dazevedo Aurvalle, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 28/06/2023.
HABEAS CORPUS. PEDIDO LIMINAR INDEFERIDO. AFASTADAS AS ALEGAÇÕES DE SUSPEIÇÃO E DE INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO. SUPORTE PROBATÓRIO INSUFICIENTE PARA PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CONCESSÃO PARCIAL DA ORDEM.
1. Habeas corpus, com pedido liminar indeferido, contra decisão que recebeu denúncia pela prática de crime prevista no art. 350 do Código Eleitoral.
2. Conforme jurisprudência do TSE, a possibilidade de trancamento de ação penal, por meio da via estreita do habeas corpus, somente é possível quando há ilegalidade ou teratologia capazes de suprimir a justa causa para o prosseguimento do feito.
3. Da suspeição da magistrada. Art. 254 do Código de Processo Penal. Os fatos narrados pelos impetrantes e os documentos acostados não demonstram situação que, de plano, possa caracterizar amizade íntima, inimizade capital ou qualquer outro elemento indicativo de que a juíza tenha interesse no julgamento da causa em favor de uma das partes ou que tenha atuado com um mínimo de parcialidade, nos exatos termos da decisão que analisou a alegação contida na defesa preliminar. Inexistência de elementos que demonstrem a afetação subjetiva ou o interesse da magistrada em determinado resultado do processo penal a lhe comprometer a imparcialidade.
4. Da incompetência do juízo. A incompetência do juízo é arguida por exceção (art. 108 do CPP), somente sujeita a recurso quando houver acolhimento do pedido e declinação para o juízo competente (art. 581, incs. II e III, do CPP). Admite-se o manejo do habeas corpus exclusivamente nas hipóteses em que haja prova pré-constituída e que o exame da matéria não se revista de complexidade incompatível com a estreita via do remédio constitucional (STJ; HC 201000250987, Relatora: Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe de 11.5.2011). Na hipótese, a Zona Eleitoral cumula as competências de zona especializada em razão da matéria, na forma da Resolução TRE-RS n. 326/19, com a competência original, atribuída a todas as zonas eleitorais do Estado, para o processo de julgamento de infrações penais eleitorais que ocorram sob sua competência territorial, conforme estipula o art. 2º do referido diploma normativo. Ausente ilegalidade no fato de a Zona Eleitoral ter declinado da competência em razão da inexistência de conexão do crime eleitoral com alguma das infrações que atrairiam a competência especializada em razão da conexão com delitos definidos na Resolução TRE-RS n. 326/19 e, posteriormente, após retorno do feito à Zona Distribuidora, ter recebido o mesmo processo por competência criminal-eleitoral comum. Não vislumbrada ilegalidade flagrante, demonstrada de plano, a recomendar a concessão do habeas corpus.
5. Da ausência de fundamentação da decisão de recebimento da denúncia. A decisão que recebe a denúncia não reclama motivação profunda ou exauriente, sob pena, inclusive, de indevida antecipação do julgamento de mérito, que somente poderá ser proferido após o curso da instrução criminal, com as devidas garantias da ampla defesa e do contraditório. Nessa linha, é reiterada a jurisprudência do STJ e do STF sobre a dispensabilidade de fundamentação minudente ou profunda no recebimento da denúncia.
6. Da prescrição da pretensão punitiva estatal pela pena em abstrato. O verbo nuclear do tipo penal imputado ao denunciado consiste em “omitir” em documento público ou particular declaração que nele devia constar, nos termos do art. 350 do CE. Dessa forma, o crime não se consuma no momento do recebimento de eventuais doações eleitorais, mas na data em que tais recursos não são declarados na prestação de contas de campanha apresentada à Justiça Eleitoral. Inocorrente a prescrição ou patente ilegalidade na decisão que afastou a alegação de extinção da pretensão punitiva estatal.
7. Da ausência de justa causa para o exercício da ação penal e da inépcia da denúncia. Embora a colaboração premiada seja apta a autorizar a instauração de inquérito policial para a apuração dos fatos, o meio de prova não se presta, por si só, a justificar a deflagração da ação penal quando desacompanhada de outros elementos externos de informação que corroborem as declarações do informante e demonstrem a viabilidade mínima da pretensão punitiva do Estado. Na hipótese, apesar do esforço do Ministério Público Eleitoral, é manifesto que a demanda penal, sob a perspectiva da colheita de elementos que lhe conferissem suporte probatório mínimo, foi ajuizada de forma precoce, não havendo sequer indicativos de que outras provas pudessem ser alcançadas. Logo, o conjunto probatório produzido no curso da investigação reveste-se de fragilidade manifesta, pois se limita ao depoimento do colaborador premiado, e à perícia realizada nos sistemas informatizados manejados pelo mesmo grupo empresarial doador.
8. Constatada a ausência de justa causa para o prosseguimento da ação, deve ser concedida a ordem para trancar a ação penal por ausência de substrato probatório mínimo de autoria e materialidade sobre os fatos narrados na denúncia.
9. Concessão parcial da ordem.
HABEAS CORPUS CRIMINAL nº060001098, Acórdão, Relator(a) Des. CAETANO CUERVO LO PUMO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 05/05/2023.
RECURSO CRIMINAL. ELEIÇÕES SUPLEMENTARES 2017. CRIME. CORRUPÇÃO ELEITORAL. BOCA DE URNA. ART. 39, § 5º, INC. II, DA LEI N. 9.504/97. REJEITADA A PRELIMINAR DE INTEMPESTIVIDADE DO RECURSO. AUSENTE PRESCRIÇÃO A SER RECONHECIDA.DEMONSTRADAS MATERIALIDADE E AUTORIA. AUSENTES CAUSAS EXCLUDENTES DE TIPICIDADE, ANTIJURIDICIDADE E CULPABILIDADE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. DESPROVIMENTO.
1. Insurgência contra sentença que julgou procedente denúncia oferecida pelo Parquet Eleitoral, condenando o recorrente como incurso no crime tipificado no art. 39, § 5º, inc. II, in fine, da Lei n. 9.504/97.
2. Rejeitada a preliminar de intempestividade do recurso. No caso dos autos, após a intimação do defensor dativo, o réu foi intimado da sentença de forma pessoal, devendo-se contar o prazo recursal deste último ato. Portanto, o recurso mostra-se tempestivo, pois respeitado o prazo recursal de 10 (dias) previsto no art. 362 do Código Eleitoral.
3. Ausente prescrição a ser reconhecida. Com o trânsito em julgado da sentença condenatória para o órgão acusatório, a prescrição da pretensão executória passou a ser regulada pela pena concretamente aplicada na sentença,verificando-se no prazo de 03 (três) anos definido para penas inferiores ao patamar de 01 (ano), conforme dispõem os arts. 110, § 1º, c/c o art. 109, inc. VI, do Código Penal. Tampouco decorrido o prazo prescricional entre a data do recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença penal condenatória, verificada com o recebimento dos autos pela serventia cartorária, restando afastado o reconhecimento da prescrição retroativa da pretensão punitiva estatal, pela pena concretizada na sentença.
4. O delito de “boca de urna” exige a distribuição de material de propaganda a eleitores ou a manifestação eleitoral que não seja realizada de forma individual e silenciosa, comportamento descrito no art. 39, § 5º, inc. II, da Lei das Eleições. O tipo subjetivo consiste no dolo genérico, decorrente da consciência e vontade de realizar a conduta típica, não se exigindo um especial fim de agir por parte do agente.
5. Considerando a ocorrência da prisão em flagrante do réu no dia do pleito suplementar e a consistência do conteúdo da prova testemunhal corroborando os elementos colhidos na fase inquisitiva, a materialidade do delito e a sua autoria restaram suficientemente demonstradas, de modo que, ausentes causas excludentes de tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade, deve ser integralmente mantida a sentença condenatória ora impugnada, inclusive no pertinente às sanções impostas ao réu, com fundamento no art. 39, § 5º, inc. II, in fine, da Lei n. 9.504/976. Provimento negado.
Recurso Criminal nº060012775, Acórdão, Relator(a) Des. AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE.
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. CRIME ELEITORAL. ELEIÇÃO 2008. DENÚNCIA REJEITADA. ART. 39, § 5º, INC. II, DA LEI N. 9.504/97. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO. ART. 302 DO CÓDIGO ELEITORAL. AFASTADO O RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO EM PERSPECTIVA. APLICADO FUNDAMENTO DIVERSO. INÉPCIA DA INICIAL. AUSÊNCIA DA ELEMENTAR TÍPICA EXIGIDA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA DEFLAGRAÇÃO DA AÇÃO PENAL. MANTIDA REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. PROVIMENTO PARCIAL.
1. Insurgência contra sentença que julgou extinta a punibilidade, por reconhecer a prescrição da pretensão punitiva do Estado, em perspectiva, com fundamento no art. 107, inc. IV, do Código Penal, com relação aos 2º e 3º fatos descritos na denúncia, e tipificados no art. 302 do Código Eleitoral.
2. O dispositivo que tipifica a concentração ilegal de eleitores art. 302 do Código Eleitoral ¿ teve revogada sua parte final pelo disposto no art. 11, inc. III, da Lei n. 6.091/74. Embora os fatos amoldarem-se ao referido artigo, não cabe neste momento proceder à emendatio libelli prevista no art. 383 do Código de Processo Penal, por não ser esta cabível quando do recebimento da denúncia.
3. Inadmissível a chamada prescrição pela pena projetada, consoante Súmula n. 438 do Superior Tribunal de Justiça, não havendo fundamento legal para o seu reconhecimento. Afastada a extinção da punibilidade pelo reconhecimento da prescrição em perspectiva da pretensão punitiva estatal, com base na pena máxima em abstrato.
4. O recebimento da peça acusatória, nos termos do art. 41 do Código de Processo Penal, exige conjunto probatório idôneo o suficiente para dele se inferir a comprovação da ocorrência do delito e indícios suficientes de sua autoria. No caso dos autos, inexistente lastro probatório mínimo, diante da ausência da elementar típica exigida. Caracterizada a inépcia da denúncia e a ausência de justa causa a autorizar a deflagração da ação penal. Mantida a rejeição da denúncia, por fundamentação diversa.
5. Provimento parcial.

